quinta-feira, 17 de julho de 2008

Sexo - Cinco Sentidos.


O sexo tem sentido. Não sentido único, nem explanação unilateral de como o entendemos, nem sentido filosófico ou literal. O sexo tem sentido além e aquém desses sentidos existenciais. O sexo tem cinco sentidos. É olhar, é cheiro, é gosto, é sussurro, é tocar e adormecer no calor de outrem. Não há de se pensar neste momento como o amor, esta hercúlea incógnita, se enraíza e cria frutos dentro da concepção do que é um subjetivo sentir tais prazeres. Aqui não há imbricações no que se refere à cópula. Apenas sexo em sua unidade.

Certa vez um homem se apaixonou no ônibus. Era uma garota linda, de saia branca e bota de borracha, carregava uma bolsa estranha e pendia entre o sono e a vontade de chegar em casa, não importa onde fosse. Mas era linda. Tinha olhos claros que nada refletiam senão apenas a estafa da lotação e o cansaço do fim do dia. Não houve casamento, apenas paixão repentina, desejo de ouvir sua voz, seu nome, sua respiração baixa e seus gemidos, sua maneira de gozar a vida. Era carnal, pecaminoso, amar de repente como se a aliança no dedo fosse apenas um adorno. Casamentos terminam por muito menos. Ela desceu e ele voltou a ler o caderno de esportes do seu jornal. Ali o sexo veio através do olhar, mesmo que se perpetuasse apenas no mundo das idéias, que foi o que realmente ocorreu. Aqueles olhares, não recíprocos, um libertino e reprimido, outro gotejado de desdém, desenharam um sexo indiferente e apenas por uma perspectiva ótica e mal planejada.

A mesma garota chegou à sua casa e tomou banho. Tinha que esperar o namorado chegar de carro, pois iam dar um passeio ao cinema. Quem sabe uma esticada até o motelzinho de sempre. Ela escovava os cabelos enquanto os secava com o secador velho e desmantelado. Enquanto imaginava se ainda tinha chicletes na bolsa e dinheiro pra comprar camisinha na farmácia, ela também olhava no guarda-roupa qual perfume escolher para aquela ocasião. O relógio, mesmo adiantado denunciava o atraso do “parceiro”. Ela escolheu uma fragrância francesa, paga em quatro prestações, Avant L’Amour com um toque de feromônio. Quem era mesmo a caça? Não é necessário dizer como acabou a noite. Os homens têm uma doçura singular, pensam com a cabeça do pau. Plebeísmo ou não, no termo exato dessa linguagem mais rude, mesmo se ela tivesse usado o desodorante da mercearia do Zé (amigo do seu pai), o fim teria sido o mesmo. Sexo. Em contrapartida, se ele tivesse passado nas axilas a versão masculina do mesmo desodorante barato, certamente a noite teria outro desfecho. Abstinência sexual. Não é a retórica das tendências “perfumológicas” que interessam, mas sim o jeito cômico e quase trágico do que representa os cheiros que as pessoas estão habituadas a sentir no dia-a-dia. É notável quando alguém sabe que o marido, a esposa, os filhos ou um ente qualquer está presente ou transeunte, apenas pelas percepções odoríferas. Além do que, o cheiro da mulher ou do homem, decorrente de cremes, loções, perfumes ou inúmeras destas diversidades de costumes que cause a excitação erótica, é o que se pode dizer de sexo olfativo.

O beijo. Quantos sabores ele nos dá? E quantos dissabores ele pode trazer? O beijo incita outro beijo, à paixão, ao ciúme, às traições. Jesus foi traído com um beijo. Mortal. Trouxe pela cruz e redenção os rituais da nossa via-crúcis. Não a cerimônia da morte e ressurreição, mas a fixação e indexação de símbolos representativos daquele beijo amargo e hipócrita que outrora foram escondidos da sociedade. Mas o beijo, este elixir irremediável dos amantes, origina sexo, leva adiante todas as conseqüências da necessidade de ter alguém para descarregar os excessos hormonais. E como o fim justifica os meios, o beijo na boca leva-nos indubitavelmente ao sensual, à cama na alcova da volúpia. O beijo tem gosto de sexo e vice-versa. Não acredita? Leia a bula antes de usar.

“Eu te amo” disseram-se os recém-casados na porta da igreja. Cumprir essa afirmação por toda vida era ainda uma lacuna. “Eu te amo” gritou a menina que recebera do namorado um presente de aniversário ridículo. E naquela noite ele repetiu a mesma coisa enquanto ardia a cabeça do seu pênis só para tirar a virgindade da suposta mulher da sua vida, que mal saíra das fraudas. “Eu te amo” tem vários desdobramentos em múltiplas situações. Sexualmente há dois fatores agravantes: quando a mulher o diz na hora do orgasmo, há uma chance remota de ser uma frase verídica, verosímil. Quando é o homem que usa essa máxima (e não mais afirmação romântica novelística), as probabilidades são completamente insignificantes. “Eu te amo” se diz numa quarta-feira chuvosa, na comunhão silenciosa das mãos dadas no metrô, numa tarde de domingo (no intervalo do jogo de futebol), naquele momento em que as palavras vêm após o olhar cheio de intenções benévolas. No sexo, “eu te amo” é armadilha perniciosa, porque amar não é grito, é murmúrio, devoção.

Todos os sentidos foram evidenciados devidamente. Mas e o ato de fazer, consumir? É como degustar uma sobremesa e usar quase todos os sentidos. Mas o tato, o toque, a carícia, a saliva (sombra do beijo), não precisam de palavras que os descrevam. Sexo é “pegada”, mordida, dente, unha, arranhão, marcas, gozo. Ele fala por si só e não precisa de mais nada. As roupas jogadas, os abraços soturnos, os suspiros que precedem o clímax e o deleite, tudo é belo e palpável. Depois do banho, pela manhã em despedida com a camisa amarrotada, onde todos os sonhos foram desnudados, o sexo tem rumos e sentidos quase revelados. No fim desta tese refutável, sublime, absurda e contestável, ficam além das divagações, as sensações que jamais poderão ser apagadas. Este é o ofício lírico que separa e estrutura organismos, sentimentos e pessoas.

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Você me ama?


Eu faço sexo geralmente nas madrugadas de domingo. É quando tenho tempo, quando tenho disposição para expor inversamente o que durante a semana é só frustração. Minha mulher tem ficado mais bonita a cada final de semana, a cada ano novo que entra. Sempre jovial e disposta a procurar prazer onde em mim as mesmas buscas não passam de um mero despudor. Cada dia um batom novo, um perfume diferente, cremes, xampus, redutores das linhas de expressão. E eu? Troco de perfume ou de marca de sabonete quando acho necessário e essa necessidade vive mesmo, apenas na semântica da palavra, no seu sentido literal. Os universos são distintos, o homem e a mulher são biologicamente diferentes e mesmo assim se amam como se fossem iguais. Cada um se completa ou se suporta? Aprende a conviver com os defeitos e as diferenças ou os sobrepujam? Essas são perguntas que apenas fazem proliferar teorias e mais teorias sexistas e que, na prática, ao invés de suporem soluções para o impasse, dão um nó nas nossas cabeças pensantes.
 

O fato é único, uno e universal. Eu amo uma mulher que dá tudo de si e eu retribuo com tudo de mim. Mantemos o sexo aceso e colocamos combustível para que ele se mantenha fervilhante depois de cada ano. Vocês chegaram ao mesmo consenso que eu? Amor: combustão espontânea. É isto que mantém tudo nos eixos, mesmo que haja pela manhã uma toalha em cima da cama ou uma calcinha pendurada no registro do chuveiro. Quando ela quer saber se eu a amo de verdade, não me faz perguntas, nem retaliações, apenas beija a minha boca. E isto é tudo.